O presidente Luiz Inácio Lula da Silva demitiu nesta
terça-feira, 14, o ex-senador Jean Paul Prates do comando da
Petrobras. Para o seu lugar, o petista indicou Magda Chambriard,
ex-diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e
Biocombustíveis (ANP) durante o governo de Dilma Rousseff.
O presidente deve justificar a demissão de Prates pela “demora
de entrega de promessas”. A demissão foi anunciada nesta terça numa
reunião no Palácio do Planalto em que estavam, além de Prates, os
ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e da Casa Civil,
Rui Costa. Segundo apurou a reportagem, a indicação de Chambriard é
de Rui Costa.
A demissão de Prates acontece um dia após a divulgação do
balanço da companhia. A estatal (BOV:PETR3) (BOV:PETR4) fechou o
primeiro trimestre de 2024 com lucro líquido de R$ 23,7 bilhões,
37,9% a menos do que há um ano, e 23,7% inferior ao registrado no
trimestre imediatamente anterior.
Mas a causa da troca, apurou o Estadão/Broadcast, se deve à
cobrança por maior velocidade na execução dos projetos anunciados
pela empresa, principalmente em relação à encomenda de navios aos
estaleiros brasileiros.
Prates foi chamado por Lula ao Palácio sem que a pauta estivesse
definida. Reuniu uma série de assuntos que poderiam estar no alvo
de atenção de Prates, que foi pego de surpresa pela demissão, ainda
que fosse o primeiro encontro dos dois desde a crise em torno do
pagamento dos dividendos extraordinários da Petrobras.
Na ocasião, Lula havia deliberado pela retenção dos recursos em
reunião com Prates, Costa e Silveira no Palácio do Planalto.
Prates, por sua vez, foi a público defender que seria possível
distribuir metade dos recursos. A conduta foi reprovada em
Brasília, sob a alegação de que houve uma quebra do que havia
deliberado o governo.
A não distribuição provocou uma crise com investidores, que
tinham a expectativa na direção oposta. Mas Prates também
desagradou aos colegas de governo, como o vice-presidente Geraldo
Alckmin, Silveira e Costa por não dar soluções rápidas a pedidos
para a ampliação da oferta de gás natural mais barato, o que
poderia ajudar a dinamizar a economia.
Aliados de Silveira alegam que a gestão de Prates também não
apresentou marcas que eram desejadas, como a redução do preço dos
combustíveis, o que minou o apoio dele dentro do próprio PT. Com o
governo sob restrição fiscal, a expectativa de integrantes do
partido era que a Petrobras ampliasse sua atuação no campo social e
econômico.
Prates é um quadro do PT, mas é considerado um novato no
partido. Chegou ao Senado como suplente da governadora do Rio
Grande do Norte, Fátima Bezerra (PT-RN). Na Petrobras, recebeu
críticas sob reserva de que atuava em prol dos acionistas privados
e não comprava brigas do governo.
Lula, segundo relatos, preferiu esperar a poeira baixar para
anunciar a retirada dele do cargo. Uma lista de potenciais
candidatos chegou a circular, com nomes como o do presidente do
BNDES, Aloizio Mercadante. A escolha dele não prosperou, segundo
fontes do PT, porque não houve apoio de Fernando Haddad para a
iniciativa – empoderado com o orçamento da Petrobras, Mercadante
ficaria grande demais.
A Petrobras confirmou na noite desta terça, em comunicado, que
recebeu a solicitação de Prates para que o conselho de
administração avalie o encerramento antecipado de seu mandato “de
forma negociada”. Segundo a companhia, Prates disse ainda, caso o
colegiado aprove o fim de seu ciclo à frente da estatal, que
apresentará renúncia ao cargo de membro do conselho.
Em nota, a Federação Única dos Petroleiros (FUP) afirmou
respeitar a decisão soberana do presidente Lula, “seja ela qual for
em relação ao comando da Petrobras”. A entidade agradeceu pelo
“relacionamento construtivo desenvolvido ao longo dos últimos anos
com Jean Paul Prates à frente da maior empresa do país e deseja que
a boa relação com uma futura gestão da estatal seja mantida, em
favor do fortalecimento da Petrobras, do desenvolvimento do país e
dos trabalhadores”.
A presidente do PT, Gleisi Hoffmann (PR), disse acreditar que a
situação de Prates havia se estabilizado, mas que não chega a ser
uma surpresa a saída dele. “Surpresa não, sempre teve muita
discussão ali”, disse.
O ministro da Previdência Social, Carlos Lupi, afirmou que Lula
deve ter “motivos administrativos” para a demissão de Prates. “É
uma decisão do presidente da República. Gosto, sou amigo pessoal do
Jean, mas é a maior empresa brasileira. O presidente deve ter seus
motivos administrativos para fazê-lo”, disse Lupi ao
Estadão/Broadcast, nos bastidores do Congresso Brasileiro do
Cooperativismo. O ministro afirmou desconhecer o que motivou a
decisão. “Só o presidente pode falar. Da Petrobras, não tenho essa
profundidade de conhecimento”, acrescentou.
Após a divulgação na troca de comando da estatal, os American
Depositary Receipts (ADR) da Petrobras inverteram o sinal para
queda, no after hours da Bolsa de Nova York (Nyse). Elas fecharam
em queda de 7,59%. Nesta terça, no Ibovespa, as ações da Petrobras
caíram 2,74% (ON) e 1,80% (PN), tomando da empresa R$ 13,2 bilhões
em valor de mercado.
Gestão marcada por atritos
A gestão de Prates à frente da Petrobras foi marcada por atritos
com Silveira. Os dois trocaram farpas públicas por diversas vezes
em relação aos rumos da empresa – que, formalmente, é subordinada
ao Ministério de Minas e Energia.
Antes da posse de Lula, Prates chegou a ser especulado para
assumir o ministério. Mas preferiu ficar com a presidência da
estatal. Na configuração final, o ministério acabou nas mãos de
Silveira, senador pelo PSD mineiro, mesmo partido do presidente do
Senado, Rodrigo Pacheco.
Desde o início do governo, houve embates entre os dois pelos
espaços de poder na companhia. Na divisão acertada no governo,
Silveira ficou mais responsável pelos nomes do conselho de
administração, e Prates, com a direção executiva, que toca o dia a
dia da companhia.
No início de março deste ano, a crise se agravou com a decisão
da Petrobras de reter dividendos extraordinários, o que levou a
companhia a perder R$ 56 bilhões de valor de mercado em um único
dia. A decisão foi revertida em assembleia de acionistas no fim de
abril.
Também houve desavenças em relação à política da empresa para o
gás natural, por exemplo, virou bate-boca nas páginas dos jornais
no ano passado. Silveira fez reiteradas críticas à política de
reinjeção de gás em reservatórios de petróleo com o intuito de
aumentar sua pressão interna e facilitar a produção de óleo. Em 16
de junho do ano passado, Silveira disse que Prates estava sendo “no
mínimo negligente” com relação ao gás.
“Entre agradar o Jean Paul e cumprir o compromisso do governo
com a sociedade brasileira, de gerar emprego e combater
desigualdade, prefiro que ele feche a cara, mas que nós possamos
lograr êxito na política pública”, disse o ministro, à época.
Alguns dias depois, Prates rebateu, também publicamente. “Não
adianta só berrar pelo jornal, nem achar que um está rindo demais e
outro está fazendo careta. Não adianta nem careta nem sorriso,
adianta trabalhar junto e convergir”, disse, durante coletiva no
Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) ao
lado do presidente do banco, Aloizio Mercadante. “Se não tem gás
para todos os segmentos, vamos trabalhar o mix (de oferta de
energia) em vez de criar polêmica onde não existe.”
Em novembro do ano passado, Silveira cobrou Prates, em uma
entrevista à GloboNews, por uma redução mais expressiva no preço
dos combustíveis por conta da queda no preço internacional do
petróleo. “Eu já esperava uma manifestação para que a Petrobras
tivesse apresentado uma redução mais significativa dos preços.
Hoje, no óleo diesel, vejo uma possibilidade real de redução entre
32 a 42 centavos e, na gasolina, entre 10 e 12 centavos”, afirmou
Silveira.
Prates voltou a rebater: “Jamais o presidente Lula me pediu para
baixar ou aumentar o preço de combustíveis. Volta e meia ele (Lula)
me liga para saber como está o mercado de petróleo, mas pedir para
baixar preço, nunca”, disse, ao ser questionado a respeito das
declarações de Silveira.
Segundo pessoas que acompanhavam o processo, um dos pontos de
conflito na relação entre Prates e Silveira tinha relação com o
plano de investimento. O MME tem restrições aos investimentos
massivos em energias renováveis, incluindo a compra de projetos em
operação. O ministério questiona esses investimentos, que podem
chegar a 15% do total previsto no Plano Estratégico para o período
de 2024 a 2028 – e teria o apoio dos conselheiros minoritários,
mais interessados em reforçar o braço de exploração e produção da
companhia. (Com Flávya Pereira, especial para a AE).
VISÃO DO MERCADO
As ações da Petrobras registram um dia de forte queda na Bolsa
brasileira, já antecipada pelo movimento dos ADRs (recibo de ações
negociados na Bolsa de Nova York) após a repentina saída de Jean
Paul Prates da presidência da estatal e a indicação da ex-ANP
(Agência Nacional de Petróleo, Gás e Biocombustíveis) Magda
Chambriard.
Com isso, a empresa tem perda de cerca de R$ 37 bilhões em valor
de mercado. Há pouco, Petrobras ON recuava 7,45% (R$ 39,73) e ação
PN perdia 6,44% (R$ 38,24).
A mudança em si não foi tão surpreendente, mas o momento da
saída de Prates pegou os investidores de surpresa e levantou
novamente os riscos de governança da estatal. Assim, na B3, após
cerca de dez minutos em leilão, os papéis PN abriram, passando a
ter queda de 6,58%, a R$ 38,18, às 10h16 (horário de Brasília).
As ações ON ficaram em leilão até 10h15, abrindo com queda de
mais de 7% e com desvalorização de 7,17%, a R$ 39,85, às 10h17.
A XP aponta que a mudança repentina na gestão adiciona
significativa incerteza ao caso de investimento da estatal e
consequentemente aumenta seu risco.
Os analistas da casa lembram que vários veículos de comunicação
noticiaram que o descontentamento político com a relativa
independência da Petrobras do governo foi uma das principais
motivações por trás da mudança de CEO.
“Este contexto provavelmente levantará preocupações dos
investidores minoritários sobre o possível risco de interferência
do acionista majoritário (ou seja, o Governo) na gestão da
empresa”, avalia a equipe de análise.
Os investidores estão particularmente preocupados com conflitos
de interesse em temas como distribuição de dividendos, política de
preços, planos de investimento, passivos fiscais contingentes e
outros, citam os analistas.
“Embora não esperemos mudanças significativas nos dividendos e
planos de capex a curto prazo, reconhecemos que a incerteza aumenta
consideravelmente a percepção de risco”, apontaram em relatório
antes da abertura do mercado, já prevendo assim reação negativa na
sessão de negociação.
informações Broadcast
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